Mercado
Economia

A Diferença do Valor Para Adam Smith e Carl Menger

Este artigo visa mostrar a diferença dos conceitos sobre o valor para Adam Smith e Carl Menger, ao mesmo tempo em que demonstrará a importância dessa revolução causada por este último para o desenvolvimento da Economia Política.

O Mercado Como Coesão Social

Adam Smith enxergava no Mercado um fator de coesão social, onde cada um dos indivíduos faria o seu trabalho e, através da busca individual por saciedade de suas necessidades acabaria por gerar um bem-estar maior para todos.

Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que esperamos nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelo seu próprio interesse. Dirigimo-nos não à sua humanidade, mas à sua auto-estima, e nunca lhes falamos das nossas próprias necessidades, mas das vantagens que advirão para eles. Ninguém a não ser o mendigo sujeita-se a depender sobretudo da benevolência dos semelhantes.

A Riqueza das Nações Volume I, Nova Cultural, p.25

Para que isso ocorresse a troca é fundamental para Adam Smith, pois segundo o próprio:

Essa divisão do trabalho, da qual derivam tantas vantagens, não é em sua origem, o efeito de uma sabedoria humana qualquer, que preveria e visaria esta riqueza geral à qual dá origem. Ela é consequência necessária, embora muito lenta e gradual, de uma certa tendência ou propensão existente na natureza humana que não tem em vista essa utilidade extensa, ou seja: a propensão a intercambiar, permutar ou trocar uma coisa pela outra.

A Riqueza das Nações Volume 1, Nova Cultural, p.24

Em suma: da troca nasce à necessidade dos indivíduos de se especializarem e dividir o trabalho, gerando assim um excedente produtivo.

Dinheiro Para Smith: Origem e Uso

Mesmo com excedente produtivo ainda era um inconveniente trocar mercadorias. Teria-se de achar alguém com a mesma disposição para se fazer a troca. Por exemplo: um açougueiro que demandasse trigo, teria de encontrar um produtor de trigo que demandasse carne e assim a troca estaria feita.

Os povos, então, passaram a achar um meio de troca válido entre todos da sociedade para intermediar as trocas: nascia então, o dinheiro.

O Valor Para Adam Smith

Smith entendia que o dinheiro era um meio de intermediar as trocas, e o valor de fato repousava não neste, mas na própria mercadoria. Para ele, há um duplo significado na palavra valor: “valor de uso” e “valor de troca“.

Importa observar que a palavra VALOR tem dois significados: às vezes designa a utilidade de um determinado objeto, e outras vezes o poder de compra que o referido objeto possui em relação a outras mercadorias. O primeiro pode-se chamar “valor de uso”, e o segundo, “valor de troca”.

A Riqueza das Nações Volume I, Nova Cultural, p.35

Nasce o Paradoxo de Smith

A fim de demonstrar a ideia do valor de uso e do valor de troca da mercadoria, Adam Smith, então, demonstra seu argumento através deste que ficou sendo conhecido como “o paradoxo da água e do diamante”.

As coisas que têm o mais alto valor de uso frequentemente têm pouco ou nenhum valor de troca; vice-versa, os bens que têm o mais alto valor de troca muitas vezes têm pouco ou nenhum valor de uso. Nada é mais útil que a água, e no entanto dificilmente se comprará alguma coisa com ela, ou seja, dificilmente se conseguirá trocar água por alguma outra coisa. Ao contrário, um diamante dificilmente possui algum valor de uso, mas por ele se pode, muitas vezes, trocar uma quantidade muito grande de outros bens.

A Riqueza das Nações Volume I, Nova Cultura, p.35

Mas então, de onde surge o valor dos bens? Smith argumenta que o trabalho é o que daria de fato valor às coisas:

O preço real de cada coisa – ou seja, o que ela custa à pessoa que deseja adquiri-la – é o trabalho e o incômodo que custa sua aquisição.

A Riqueza das Nações Volume I, Nova Cultural, p.36

Esse é o início da teoria do valor-trabalho de Smith, a qual Carl Menger um século mais tarde, rebate.

A Revolução Marginalista

Quase um século após Adam Smith dar o pontapé inicial nos estudos de Economia Política, três intelectuais, quase que por coincidência, lançaram luzes à teoria do valor e deram início à revolução marginalista.

Um desses intelectuais foi Carl Menger e, assim como William Stanley Jevons e Léon Walras começaram a entender o valor como algo subjetivo aos indivíduos e não mais objetivo, como era até então feito na tradição clássica. 

A diferença de abordagem de Menger para Jeavons e Walras é que enquanto o primeiro entendia a economia como postulados lógicos, partindo de premissas, os outros dois, assim como a tradição clássica, enxergavam a Economia como uma série de teoremas, fórmulas e números. Podemos exemplificar isso com em um trecho de Jesús Huerta de Soto em seu livro sobre A Escola Austríaca:

A ideia distintiva mais original e importante contribuição de Menger radica, portanto, na tentativa de construir toda a economia partindo do ser humano, considerado como ator criativo e protagonista de todos os processos sociais. Menger considera imprescindível abandonar o estéril “objetivismo” da escola clássica anglo-saxônica, obcecada pela suposta existência de entidades externas de tipo objetivo (classes sociais, agregados, fatores materiais de produção, etc) devendo o cientista da economia situar-se, pelo contrário, sempre na perspectiva subjetiva do ser humano em que atua, de maneira a que a referida perspectiva influencie de forma determinante a fim de elaborar todas as teorias econômicas.

A Escola Austríaca, Instituto Ludwig von Mises Brasil, p.60

O homo economicus saia de cena e o homo agens, que mais tarde seria retratado por Ludvig von Mises em Ação Humana, começava a dar os primeiros passos.

O Valor Para Carl Menger

Carl Menger parte da lógica que todas as coisas são regidas pela lei da causa e efeito, e isso não seria diferente para nós, seres humanos e nem para os bens. Para ele:

As coisas capazes de serem colocadas em nexo causal com a satisfação de nossas necessidades humanas denominam-se: utilidade e, denominam-se bens na medida em que reconhecemos esse nexo causal e temos a possibilidade e capacidade de utilizar as referidas coisas para satisfazer efetivamente às nossas necessidades.

Princípios de Economia Política, Nova Cultural, p.33

Entendido a compreensão sobre bens de Menger, é interessante notar que o valor não está no respectivo bem em si, mas na relação em que o bem têm com a satisfação de nossas necessidades. Nas palavras do próprio Menger:

O valor não é algo inerente aos próprios bens; não é uma propriedade dos mesmos e muito menos uma coisa independente, subsistente por si mesma. O valor é um juízo que as pessoas envolvidas em atividades econômicas fazem sobre a importância dos bens de que dispõem para a conservação de sua vida e de seu bem-estar; portanto, só existe na consciência das pessoas em questão.

Princípios de Economia Política, Nova Cultural, p.77

A escassez do determinado bem também influencia no valor do referido bem, pois se um bem for demasiadamente abundante, ele perde a qualidade de bem porque haverá tamanha abundância desse bem que as pessoas passam, basicamente, a desvalorizá-lo.

Também é claro que parte dessa quantidade de bens permanece sem ser utilizada, ou então perde sua utilidade para as pessoas, sem que isso nada sofra no atendimento das necessidades concretas.

Princípios de Economia Política, Nova Cultural, p.62

A Solução do Paradoxo de Adam Smith

Ora, se o valor dos bens é algo subjetivo aos indivíduos, que enxergam alguma utilidade nesse bem para satisfazer suas próprias necessidades, é fácil concluir que, as pessoas valorizem mais o diamante (que não tem tanta importância para nós, seres humanos) que é escasso do que a água (tão importante para a vida) que é abundante.

As coisas se inverteriam caso mudássemos de local, por exemplo num deserto, onde a água seria um bem escasso de tal forma que o valor de uma garrafa tenderia ao máximo e um diamante não teria valor algum.

Por Que Isso É Importante?

A partir desse texto foi possível compreender as diferenças entre o valor para Adam Smith e Carl Menger, e entender essa diferença é importante para todo o crescimento da ciência econômica, principalmente no que tange ao entendimento dos ciclos econômicos, teoria da moeda e juros e função empresarial tão bem trabalhadas pela Escola Austríaca de Economia.

3 Comentários

  • Glauber D. Martins

    Como dizia José Munir Nasser: ” A econômia é uma coisa simples, e deveria ser acessível a todos”
    Obrigado pelo trabalho!

    • Beatriz Souza

      O valor é definido pelas “pessoas envolvidas em atividades econômicas”…
      Para a economia (e seus maravilhosos cálculos), o valor depende do quanto os seres humanos de hoje estão dispostos a pagar. Essa incessante vontade de otimização de lucros no agora, ao meu ver, vai de encontro com qualquer tentativa de melhoria de qualidade de vida.

  • Guilhermo Sganzerla

    Muito bom o artigo! Eu concordo que os valores são subjetivos, aliás, cada vez mais subjetivos. Principalmente quando se tratam de serviços.

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